sexta-feira, 16 de junho de 2017

O retorno ao Vale dos Vinhedos em Bento Gonçalves/RS

Contando mais uma vez, com a participação do colaborador do blog, Serpa Jr, segue o primeiro de uma sequência de posts sobre o Vale dos Vinhedos e seus vinhos, assim como a famosa Winerun.



"Em recente viagem à região da Serra Gaúcha, estivemos em Bento Gonçalves/RS para participar da Corrida Winerun CAIXA de 21km, que poderia ser realizada no individual ou no revezamento de dupla, em meio aos parreirais do Vale dos Vinhedos, e pudemos unir o útil ao agradável, ao poder realizar experiências de enoturismo com o esporte em uma das regiões mais belas do sul do país.

Jantamos na primeira noite no Hotel & Spa do Vinho, Autograph Collection, que faz parte da rede Marriott International em parceria com a Miolo Wine Group. Ele foi criado no ano de 2007, e expandido em 2014, possui um estilo neocolonial e é o maior empreendimento hoteleiro da região, sem dúvida nenhuma um resort 5 estrelas de respeito, localizado estrategicamente ao redor do vinhedo do Lote 43, um dos vinhos premium da vinícola.

A noite foi agradabilíssima e o restaurante do referido Hotel impressionou pelo luxo e sofisticação nos detalhes de uma decoração de um Brasil Imperial, não por menos o restaurante se chama “Leopoldina”, nossa imperatriz em tempos de Dom Pedro I. 

A carta de vinhos do restaurante foi o que mais me chamou à atenção, são três cartas: uma do Vale dos Vinhedos; outra do restante do Brasil; e a terceira, do resto do Mundo. Segundo o sommelier possui a maior adega dentro de um hotel no Brasil, com capacidade para 40 mil garrafas e acervo de mais de 600 rótulos. Fiquei perplexo com a variedade e quantidade de vinhos (brancos, tintos e espumantes) já existentes no Brasil, isso é sinal retumbante do quanto se desenvolveu o setor vinícola no país nos últimos 20 (vinte) anos, não somente em relação à quantidade de vinícolas e rótulos, mas sobretudo de variedade de castas, cortes e regiões produtoras. É uma viagem alucinante pelo Brasil viticultor!!!

Provamos o vinho Maximo Boschi Biografia Merlot, safra 2007, por sugestão do próprio sommelier da casa, e apesar de no primeiro instante agradar pelos aromas evocados de fruta negra, ervas finas e baunilha, não nos agradou na boca, pois os taninos e a acidez não estavam se balanceando direito, o primeiro ainda muito maduro e acidez muito leve. Para harmonizar melhor, pedimos um suculento lombo de porco, que trouxe novos ares ao vinho, mas nada que não ultrapassasse o critério de bom vinho.

No dia seguinte, fomos na vinícola Almaúnica, fundada em 08/08/2008, pelos irmãos gêmeos Magda e Márcio Brandelli, filhos do proprietário da vinícola Don Laurindo, de mesmo nome localizada logo no início do trecho do Vale dos Vinhedos. Esse nome, segundo nossa guia no local, sugere a vinícola partiu da ideia de juntar numa mesma “alma”, vinhos únicos, sendo que ela é cercada por 3 hectares de vinhedos de cabernet sauvignon, merlot e chardonnay.

Sem dúvidas, a vinícola é uma das mais modernas e charmosas do Vale dos Vinhedos, pequena com características e produção de vinícola boutique, ela se especializou em uma casta inédita na região – a syrah.

Visitamos as instalações da vinícola e provamos toda a linha de espumantes e vinhos reserva, além do vinho Quatro Castas. O ícone da vinícola é o vinho ultra premium Almaúnica Syrah 8 anos, que tem passagem por barricas novas de carvalho americano, para elaborar 2.150 garrafas, com maturação de 24 meses. 

Sobre os espumantes, o Moscatel deles é menos doce em boca que os demais da região, especialmente aqueles produzidos em Garibaldi/PB, por isso menos enjoativo, já o Brut é bom em aromas típicos de borbulhantes como panificação, mas peca em boca com leve corpo, já o Nature é o inverso, souberam ajustar o sabor e o corpo, mas não impressiona muito em seus aromas. Nos brancos, é preciso ainda evoluir a vinícola, o Reserva Almaúnica Sauvignon Blanc 2014 era de ligeira acidez e o Super Premium Almaúnica Chardonnay 2014, amadeirado demais, mas tem fãs daqueles que gostam do estilo californiano de produzir essa casta.


Dos tintos (Reserva Merlot, Cabernet Sauvignon, Malbec e Syrah), de safras entre 2012 a 2014, os dois primeiros bem característicos das castas, mas sem muito corpo, o malbec era muito parecido com os dois primeiros, acho que por conta do terroir, possuía uma nota doce no aroma que não lembrava malbec, é preciso dizer que não se enxerga aqui nem malbecs argentinos e nem de Cahors, muito distinto, realmente às cegas não era possível afirmar se tratar da casta malbec, sendo de médio corpo e leve acidez. O vinho premium Quatro Castas também impressionou em boca, era o de mais corpo e maior persistência do painel.

A syrah sim, parece que o produtor acertou a mão e vem desenvolvendo seu vinho mais consistente e seu melhor trabalho, crendo que a vocação da vinícola seria para essa casta, o Reserva Almaúnica Syra 2014 possui aromas típicos de syrah, como pimentaa, especiados, carne, defumados, com médio corpo, e talvez a relação de melhor custo benefício produzido pela vinícola, pois eles cobram R$ 85,00 por este rótulo.

Conclusão: o visual modernista e charmoso da vinícola e de seu parreiral na entrada vale demais a visita, poucas na região são tão bonitas e sofisticadas, sendo que as instalações impressionam mais que seus vinhos, mas acredito que eles estão no caminho certo quanto à casta syrah, certamente acredito que colherão bons frutos com ela, digo isso em face da qualidade de seus syrahs no Vale dos Vinhedos, mas apostaria que ela seria ainda melhor produzida na região da Campanha Gaúcha.

Dando continuidade ao passeio, dirigimo-nos à Risoteria e Café Vallontano, já que essa vinícola, apesar de não ser uma das menores da região, não possui visitação ao público, apenas um curioso e delicado restaurante com poucas mesas provençais de frente para seus parreirais. Aqui, diga-se de passagem, o nome diz tudo, os risotos são de muito bons a excelentes, comemos um de filé mignon ao vinho do porto e outro de cordeiro e pesto de hortelã, harmonizados conforme a carta com os respectivos vinhos em taça: Reserva Tannat Vallontano e Reserva Cabernet Sauvignon Vallontano. Estamos aqui tratando de especialistas, e já sabíamos que os vinhos não decepcionariam, o Tannat deles é redondo e aromático, já o Cabernet sem arestas. 

Na volta, como ninguém é de ferro, e sempre num estilo diríamos “bausaquiano”, desvendamos a Biscoteria Itallini, dentro do mesmo Vale, aqui nós estamos falando de sentimentos, aromas e lembranças da infância que remontam o chá da tarde de nossas vovós, várias provas de biscoitinhos artesanais, com sabores exóticos como o de erva doce, vinho com passas de uva e manjericão, e outros que, realmente, merecem a degustação, como o de limão siciliano e o de capuccino.

De lá, fomos a uma fazendinha típica italiana de ovelhinhas e carneiros chamada Casa da Ovelha, produtora de artigos artesanais na região, lá se produz iogurtes, queijos, doces, molhos, e até cosméticos. Já estava na seguinte situação, se me oferecessem mais um vinho com queijo tipo pecorino toscano, só uma boa rede me salvaria, pois Orfeu tava vindo não só com os braços, mas com um porrete mesmo…!!! Aqui, quase tudo que eles produzem é de qualidade superior, o Queijo Pecorino Toscano Reserva Especial maturado 500 dias deles é dos deuses, fora os iogurtes sem lactose com frutas da região!!! Sem igual!!! Todos são de qualidade incontestável e merecem demais uma visita e degustação.

Nesse lugar além dos produtos acima, eles possuem passeios e visitas guiadas aos turistas, alguns especialmente voltados ao público infantil, e aqui aconteceu uma das primeiras e gratas surpresas dessa viagem, fomos levados a conhecer a arte da falcoaria, o que aves de rapina, como corujas, falcões e gaviões podem fazer pela humanidade. Essas pequenas aves, além de superar a expectativa na beleza e no tamanho (pequenas como minha querida esposa!!!), são agéis, destemidas e certeiras na caça de suas presas, por isso são utilizadas para inúmeros fins, desde o controle de pragas locais, como controle de aves em aeroportos nacionais e internacionais.

Interessante perceber que as iscas do adestramento dessas aves são carnes de codornas cruas. Existem outros passeios na fazenda, mais voltados para os infantes como já dissemos, como é o caso da amamentação de cabritos e show de um border colier no pastoreiro de ovelhas, o que inegavelmente irá agradar aos pequenos, coisa rara na região voltada ao enoturismo. Nessa pequena fazenda concluí uma coisa: “em terra de ovelha, eu não queria ser codorna.” Essa viagem estava apenas começando, mas uma coisa já se percebia, que o passeio iria ser de cunho hedonista e definitivamente não prosaico."

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